Friday, May 31, 2013

A bipolaridade é um fenômeno...

O dia.

(...)

O dia em que eu fui do inferno ao céu mais rápido que um míssil teleguiado, que uma flecha vertical, que um foguete com destino às estrelas, que uma gravidade invertida.

Eu estava surtando. Femininamente, surtando... imaginando de tudo, mil dores e horrores, o fio de cabelo no paletó, a gota d'água, o deslize fatal, que você estava bravo comigo, que tinha motivos para estar bravo comigo, que estava tudo acabado entre nós, enfim. Já estava até preocupada porque tava com um aperto no peito mas - ainda - não tava com vontade de chorar, o que geralmente significa sem sombra de dúvida que o buraco é mais embaixo. Que, quando a dor vier, vai ser uma enxurrada e não vai haver barragem que segure.

Assim estava eu, patética.

Até que... até que, como algo divino - "uma parada divina mesmo", você disse -, uma mudança de dados, uma troca de palavras, simples, mudou tudo. David Lynch. Ou manteve tudo como estava antes. David Lynch. Ou melhor, melhorou ainda mais o que já era impossível de melhorar. David Lynch.

Numa singeleza sem tamanho, numa simplicidade tão bonita da qual só você é capaz, você me vira e me torce e me harmoniza e me amolda ao seu bel-prazer. Eu te conto uma banalidade - David Lynch - qualquer. Do nada, você me pergunta se me pede em casamento agora ou se espera até comprar as alianças. Sim, você me pediu em casamento antes mesmo de me pedir em namoro. Ao que eu respondo qualquer coisa assim besta pra disfarçar, pra dar a entender que percebi que você estava só brincando, só falando por falar. Não satisfeito, você me diz que é "sério mesmo", que - David Lynch - é coisa séria pra você e pra eu não brincar com o seu coração. E aí eu caio, hopelessly e naturalmente, na sua armadilha e começo a te contar das vezes que eu mais gostei, das sensações e das coisas que eu senti, dos frios na barriga, da felicidade que é estar com você e ter você na minha vida... e vem você e me quebra com um "foi quando senti que você e eu não seria algo passageiro". Dizendo que o meu olhar te pegou de jeito aquele dia na lanchonete, enquanto que o seu me capturou um pouco antes, na sua peça, quando você estava olhando pra plateia. E lá ficamos os dois bobos, um querendo olhar pro outro, sem que o outro soubesse, tendo que disfarçar. Confusos. Você já desencanando de mim e eu sem esperar mais nada. Voltando pra casa pensando no que impulsivamente devíamos ter feito antes de ir. Dois bocós.

É o que nós somos, dois bocós.

Tuesday, May 28, 2013

Um amor & um doce

Eu comecei a te respeitar por você ter tolerado - quase - pacientemente todas as minhas desculpas e furadas e charmes e patadas e afins até finalmente aceitar sair com você.

Eu desconfiei das suas intenções quando você topou assistir "Assassinos por Natureza" num primeiro encontro. E em todas as vezes que você acidentalmente encostou a sua mão no meu braço no cinema.

Eu te esconjurei quando você fez aquele comentário sobre "já ter arranjado outra companhia para programas no centro até lá" antes de eu ir viajar. Mas me derreti quando você escreveu "olha quem voltou" com um coraçãozinho quando viu que eu tava de volta.

Eu achei que você pudesse estar interessado em mim quando você me mandou aquela mensagem durante aquele show sublime dizendo que você tava curtindo o som de boa do lado de fora.

Eu fiquei frustrada no dia em que você me pediu pra te avisar se eu fosse mesmo no cinema e, quando eu decidi te ligar, você disse que tava ensaiando pra sua peça e que não poderia ir.

Eu senti um arrepio na espinha e um puta frio na barriga quando você me olhou daquele jeito no meio da apresentação da peça. E quando você me perguntou, depois do espetáculo, se eu tinha visto a sua mensagem e se eu ia sair de novo com você. Eu disse que gostava de sentir vontade e de decidir as coisas na hora e você disse que eu precisava "programar um pouco a minha desprogramada vida"...

Eu achei que você ia dar em cima de mim quando a gente parou em frente àquela farmácia antes de atravessar a rua. Quando você, depois de sequer encostar em mim no cinema durante o filme inteiro, primeiro falou uma grosseria qualquer pra depois ser delicado comigo. Um elogio tão discreto e sutil não podia passar assim impune, né. Nem aquele agarrão em frente à entrada do metrô... você me assustou demais naquele dia kamikaze. Quando você disse que não era mais adolescente pra ficar dando pega no cinema. Quando você disse que ainda tínhamos "muitos assuntos a tratar" e eu não perdi a oportunidade de, infamemente, te chamar de tratante.

Eu soube que ia me interessar por você no dia daquele jogo de futebol. "A questão do tempo again between us". "Eu acho da hora de vez em quando se misturar com a massa, sabe?" Quando você deu atenção pros seus amigos e me deixou sentar sozinha no ônibus mas ficou me observando de longe por entre os bancos. Quando você me viu andando no meio dos marmanjos e colocou a mão no meu ombro e disse "calma, esse lugar aqui é perigoso". Quando você ficou me apertando inteira como que tentando se aproximar e ensaiando uma massagem no intervalo do jogo. Quando te vi emocionado com uma vitória improvável, inesperada, quase impossível. "Esse é um homem sentimental", pensei. Quando a gente foi embora juntos, de mãos dadas no meio da multidão. E quando a gente pegou aquele ônibus lotado e quente e abafado pra voltar e se divertiu mesmo assim.

Eu imaginei que ia gostar de você quando a gente teve uma sessão de cinema perfeita, daquelas bem pueris, bem de adolescente mesmo. O dia do sanduíche, bem comum, em que eu, desastrada, derramei refrigerante em mim mesma. Quando eu te contei depois que tinha ficado contente no dia seguinte e você me disse que tinha sonhado comigo. E aí, quando eu te perguntei do sonho, você ficou tentando me contar de um jeito light e politicamente correto... que "estávamos caminhando pela cidade por uma região com uma arquitetura bem antiga" - essa parte nitidamente para me agradar - e que você "morava no apartamento na Barra Funda e íamos até lá". E quando eu te disse que tinha gostado do sonho e te pedi pra você me emprestar.

Eu sabia que não tinha mais volta quando você me disse, antes de um programa cultural, "prepare-se pra se apaixonar pelas antiguidades que tem lá". Quando a gente viu aquele filme de graça e você ganhou aquele livro do David Lynch e ficou todo feliz. Quando você ficou segurando a minha mão quase que o filme inteiro. Quando a gente passeou por entre as salas e os móveis antigos da exposição e você disse que a sua casa, um dia, teria que ser assim. Quando a gente desceu de elevador do cinema e viu um pedacinho daquele show de samba do Nelson Sargento no saguão. E quando você me abraçou e pôs as mãos na minha cintura e me tirou pra dançar bem devagarzinho.

Eu tive certeza quando você disse "arte é a única coisa que faz sentido pra mim" e eu te disse que essa era uma das coisas que eu mais admirava e gostava em você. E você disse que eu era a advogada mais bonita que você conhecia e eu te chamei de bobo. Quando eu disse que a Monica Geller em mim ainda vivia e você disse que eu tava mais pra uma mistura de Phoebe e Rachel, por causa do lado bocó da Phoebe e do lado meigo da Rachel. Magali e Cebolinha? Magali e Chico Bento!

Eu me deixei levar de vez naquele dia do Teatro Municipal, quando o cara desconhecido te confundiu com o Dave Grohl e me chamou de "sua senhora". No dia em que a gente assistiu aquele jogo num boteco e você imitou o Silvio Santos pra mim e eu te mostrei o prédio em que eu gostaria de morar um dia ao lado do teatro. No dia em que eu te disse "hoje te espero em qualquer lugar, a qualquer hora, mas só hoje" e você de fato me fez esperar muito, demais mesmo! No dia em que você marcou o nosso encontro em Moscou às 19h17, horário de Brasília. Quando você conseguiu o emprego novo. No dia em que eu te liguei no ônibus de noite e fui a primeira a te desejar feliz aniversário. Quando eu te disse que o seu presente só chegava na próxima semana. Quando você me disse que eu era uma mulher muito especial.

Eu fiquei com muita raiva de você naquele dia em que, ao mesmo tempo, você me arrebatou com tudo com um beijo de cinema no meio da pista de dança e depois passou mal e me fez ficar cuidando de você a balada inteira. Porque eu, menina boba, fiquei tão preocupada com você, homem feito. Você, que não parava de ficar falando o meu nome over and over and over - pelo menos você não tinha esquecido - e de ficar me perguntando se eu tava bem e se eu não tava chorando...

Eu sabia que tava completamente perdida quando, depois de chorar todas as minhas pitangas, de te xingar de tudo quanto era nome o final de semana inteiro e de jurar nunca mais te ver, me vi te agradecendo e mandando um pedido de desculpas antes mesmo do seu. E inescapavelmente te perdoando aos primeiros "preciso muito te ver essa semana", "dessa vez prometo não atrasar", "sexta sem falta eu quero você", "eu sei o que farei contigo" e ao primeiro e singelo "oi". "You had me at 'hello'", lembra desse filme? Então. Foi igualzinho, exatamente assim. "Silvio Santos: olha só, você fez uma piada sem graça... Lombardi, quanto vale o show?".

Eu soube que não tinha mais jeito quando você me mandou aquela mensagem só pra saber se eu tinha acordado menos carente e pra me convidar pra assistir um show com você. E eu respondi que esse tinha sido o convite mais bonito que eu já tinha recebido e você disse que já tinha começado o seu dia contente.

".....................................................................
Att,
Diabo da Fonseca."

".....................................................................
Att,
Sua fã."

Eu me apaixonei por você naquela esquina. Naqueles grafites, naquele frio, naqueles escritos, naqueles abraços... naquele filme fofinho. No dia em que eu te disse que você tava "especialmente bonito" e você me disse que eu tinha mau gosto. Quando você imitou o Silvio no meio da rua e disse que eu era uma moça muito bonita e me perguntou se eu tinha namorado e se era "namoro ou amizade". Quando você me olhou no meio do filme no cinema e viu os meus olhos cheios d'água no escuro e me abraçou. No dia em que as suas mãos estavam mais macias e mais quentes do que nunca e os seus beijos mais irresistíveis do que sempre.

E você diz que soube quando me disse "você é um amor" e eu respondi "e você é um doce".

Monday, May 27, 2013

Máquina

E de repente a vida entrou num compasso de engrenagem. O tempo. As rodas girando e girando e girando... numa velocidade assustadora. E eu, sem conseguir parar, vou seguindo em frente. As areias do tempo. Bom, nesse passo, might as well seguir em frente mesmo. Sem tempo para parar, sem tempo para pensar, sem tempo para me organizar, sem tempo para arrumar nada - quem dirá as emoções -, sem tempo para escrever.

Sem tempo.

Acho que tô cada vez mais parecida com um daqueles ratinhos de laboratório, sabe? A corrida dos ratos. Que são colocados naquelas rodas gigantes para correr sem parar, ao mesmo tempo com um fiapo de esperança e numa falta de alento sem fim.

Monday, May 20, 2013

Elena

Esse filme desabou uma cachoeira em mim. Faz quase um ano, eu sei. Mas me deu uma vontade de escrever, de botar pra fora, de chorar, de ler, de ouvir, de andar, de olhar, de sofrer e de sentir tudo tanto de novo...

Os meus olhos tristes no metrô. Sinto os olhares em cima deles. Olhares curiosos, espantados, penosos, não sei... mas sinto. As lágrimas teimando em cair. Eu olho pras luzes dos túneis dos trens. Passando apressadas como riscos. Como todo mundo, como todas as pessoas. Como um risco. Os sons do salto da minha bota gasta pela calçada. Esse cimento áspero. Áspero e duro e frio e sujo. Mas mais limpo que os meus pensamentos. Os meus pensamentos sujos. A minha roupa preta suja. Os meus cabelos sujos. Os fios dançando contra o vento, descabelados, se enroscando nas palavras sussurradas por essa brisa noturna. Brisa vadia. Essa que se faz doce mas é mais dura que qualquer chão... de cimento.

Chego em casa desolada. Despedaçada. O porteiro, em toda a sua simplicidade solidária, pergunta "tá triste?". Respondo, falsamente, "não, só pensando na vida" e dou um riso tímido, como que tentando esconder o inescondível. O inefável. O etéreo, o que não se pode dizer nem tocar.

Sento para escrever e choro, ao mesmo tempo. Num desespero ritmado, calado, sofrido, escrito, tatuado. Preciso tomar banho, penso. Preciso me limpar, me lavar desse sofrer. Tirar de mim essa sensação. Do meu coração. Sexo sem amor pra mim é quase veneno, disse Petra. E Elena só queria dançar. Dançar e atuar e cantar. Arte! No meio daquela tristeza toda. "Essa não é você", dizem meus amigos. Mas eu sinto mesmo assim.

Vou chorar tudo no chuveiro, como sempre faço. Flutuando nesse mar de sentimentos, emoções e mágoas. As águas dissolvem as dores, ouvi dizer...